Cultura Organizacional. O que é tolerado e pode corroê-la.
Descubra um lado oculto da Cultura Organizacional e os perigos do que é tolerado. Uma reflexão crucial para líderes e profissionais de RH.
GESTÃO
Nos bastidores do sucesso empresarial, há um fator muitas vezes negligenciado: a Cultura Organizacional e o perigoso jogo do que é tolerado.
Edson é o Supervisor de Vendas de uma empresa de tecnologia que conhece muito bem os produtos e serviços oferecidos ao mercado, e sua equipe consegue sempre alcançar as metas estabelecidas.
No entanto, Edson é conhecido por ser autoritário e controlador, causando grande sofrimento aos seus colaboradores. Ele grita com eles, os humilha e os culpa por qualquer erro. Ele também é muito competitivo e sempre procura desqualificar os outros para se destacar.
Os colaboradores de Edson trabalham desmotivados e infelizes. Evitam falar com ele e temem cometer erros. Quando erros acontecem, procuram escondê-los de alguma forma. Muitos bons colaboradores pediram demissão devido ao seu estilo de gerir a equipe.
A alta direção da empresa conhece esse estilo de Edson, que é semelhante ao de vários outros gestores da empresa. Mas, devido a sua cultura de que os resultados financeiros indicam se tudo está bem ou não, esse estilo de gestão é tido como eficaz.
Um dia, Edson estava discutindo com uma colaboradora chamada Any. Ele estava gritando com ela diante de todos e a acusando de ter cometido um erro. Any ficou tão nervosa que começou a chorar.
Um dos colaboradores da equipe, Pedro, viu a cena e não se conteve. Ele aproximou-se de Edson e disse:
"Você não pode tratar as pessoas assim! Você não é um líder e está destruindo essa equipe!"
Edson ficou furioso. Ele gritou com Pedro e o ameaçou de demissão.
Pedro não se intimidou e disse:
"Eu não estou com medo de você! E denunciarei você à diretoria!"
Pedro cumpriu sua palavra e denunciou Edson ao Diretor Comercial. O Diretor se mostrou preocupado com as acusações de Pedro. Ele convocou Edson para uma reunião e pediu para ele mudar seu comportamento.
Edson disse que iria mudar, mas nunca cumpriu sua palavra. Ele continua tratando os colaboradores com desrespeito e a alta direção continua a tolerar seu comportamento, assim como de outros gestores.
Cultura Organizacional
Cultura Organizacional é um assunto muito amplo. Neste artigo, eu vou tratar de um aspecto bem específico da Cultura e o considero pouco explorado: Cultura Organizacional abrange também – e muito – o aspecto do que é tolerado na organização.
A Cultura Organizacional é o conjunto de padrões relacionados a valores, crenças, comportamentos e atitudes que são encorajados ou permitidos ao longo do tempo na organização. Ela influencia fortemente a maneira como as pessoas trabalham, se comunicam e interagem entre si.
Vários aspectos influenciam esses padrões, como o ambiente físico, os eventos, como as coisas são feitas, a comunicação, como as decisões são tomadas e os símbolos. Entretanto, acima de tudo isso, está como as pessoas da organização são geridas, a importância delas na relação dos stakeholders, o estilo dos mitos e líderes do passado e do presente.
A história de Edson é um exemplo de como a Cultura Organizacional pode ser tóxica, mesmo que a empresa esteja alcançando bons resultados. Quando a alta direção tolera um comportamento tóxico, está enviando uma mensagem aos colaboradores de que esse comportamento é aceitável, mesmo que veladamente. Isso pode levar a um ambiente de trabalho hostil e desmotivador, com consequências péssimas para a empresa, como:
Aumento da rotatividade de colaboradores
Diminuição da produtividade
Risco para a saúde mental dos colaboradores
Perda de clientes
Dano à imagem da empresa
Uma Cultura Organizacional positiva é aquela que promove um ambiente de trabalho saudável, produtivo e motivador. Ela é caracterizada por valores como respeito, confiança, autonomia, transparência e integridade.
Uma Cultura Organizacional tóxica, por outro lado, é aquela que promove um ambiente de trabalho nocivo, desmotivador e improdutivo. Ela é caracterizada por valores como desrespeito, desconfiança, autoritarismo, obscurantismo e punição. Valores estes, muitas vezes escondidos atrás de resultados alcançados, índices de crescimento, novos negócios e outros aspectos positivos e mensuráveis.
Em seu excelente livro "Walking The Talk – A Cultura Através do Exemplo" (2005), a britânica Carolyn Taylor, uma das maiores especialistas do mundo em mudança de Cultura Organizacional e CEO da consultoria Walking the Talk chama a atenção para o seguinte:
“Um mito muito difundido diz que a Cultura da empresa tem forte relação com as declarações de valores corporativos que podem ser encontradas, por exemplo, nos relatórios anuais. Mas, a menos que a empresa tenha ativamente trabalhado na aplicação prática desses valores, eles não constituirão nada além de uma intenção. Uma louvável intenção, é uma boa coisa para ter, mas que quase certamente não descreve a Cultura tal como ela de fato é.”
Bem, os relatórios anuais não são tão conhecidos pela maioria dos colaboradores. Mas, certamente, quase todos nós já vimos essas declarações de valores emolduradas nas paredes mais chamativas das recepções, salas de reuniões e nos corredores das empresas. Ali estão descritos os valores mais nobres que a empresa deseja praticar. No entanto, as declarações de valores são frequentemente usadas para criar uma imagem positiva da empresa, mesmo que a Cultura real seja tóxica. E quase tudo que é tolerado não faz parte dessas declarações, nem de manuais de boa conduta.
Aqui vão alguns exemplos de características de Cultura Organizacional positiva:
Valoriza o trabalho em equipe e a colaboração
Oferece um ambiente de trabalho descontraído e colaborativo
Os colaboradores se sentem respeitados e valorizados
A liderança é agregadora e inspiradora
Os líderes são exemplos positivos e estimulam o desenvolvimento dos colaboradores
É transparente, os colaboradores conhecem suas metas e seu nível de desempenho
Os colaboradores conhecem os objetivos da empresa e como eles podem contribuir para alcançá-los
E aqui vão algumas características de Cultura Organizacional tóxica:
É marcada por conflitos e disputas
O ambiente de trabalho é tenso e hostil
Os colaboradores se sentem desvalorizados e desrespeitados
Gestão tóxica das pessoas, com gestores autoritários e controladores
Os colaboradores são frequentemente punidos por erros ou falhas.
Não há feedbacks construtivos e frequentes
É obscurantista. Os colaboradores não sabem quais são os objetivos da empresa ou como eles podem contribuir para alcançá-los.
Pressão por resultados imediatos em detrimento do bem-estar a longo prazo
A tolerância nociva é um problema que também se manifesta de diversas formas além do comportamento tóxico dos gestores:
Gestores que toleram o baixo desempenho e o mau comportamento dos colaboradores.
Metas não alcançadas que não causam impacto algum nas equipes.
Equipamentos de segurança que nunca são disponibilizados.
Impontualidades frequentes.
Reuniões intermináveis e improdutivas.
Processos não padronizados ou desrespeitados.
Atitude dos principais gestores
Toda empresa tem sua Cultura. Cabe aos seus principais gestores decidirem se querem influenciá-la proativamente ou não. Parafraseando Peter Drucker, estes gestores devem considerar que as únicas coisas que evoluem sozinhas em uma organização são a desordem, os conflitos e o baixo desempenho. Eles podem deixar que a Cultura de sua organização seja definida ao acaso ou, ao contrário, ser protagonistas na construção de uma Cultura positiva.
Para isso, os principais gestores têm um papel fundamental na prevenção e combate à tolerância nociva. Eles são responsáveis por sempre agir conforme os valores da empresa, mesmo quando confrontados com questões desafiadoras.
Código de Conduta da Liderança
A elaboração de um bom Código de Conduta da Liderança pode auxiliar os principais gestores a agir segundo os valores da empresa. O Código deve descrever, entre outras atitudes, como agir diante das incoerências. Isso ajuda, no mínimo, a trazer a tona os impactos negativos causados pela tolerância nociva à cultura da empresa e fazer os gestores refletirem a respeito.
Concluindo, promover uma Cultura Organizacional positiva requer esforços contínuos e ação proativa dos líderes. Eles não apenas moldam a Cultura, mas também estabelecem o tom para o que é aceitável na empresa. Investir na construção de uma Cultura que valorize o respeito, a transparência e o desenvolvimento é crucial para garantir não apenas resultados financeiros, mas um ambiente de trabalho saudável e produtivo.
Você já vivenciou situações semelhantes às tratadas neste artigo? Compartilhe nos comentários como lidou com desafios na Cultura de onde você trabalha. Vamos aprender juntos! 😉
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Este artigo foi publicado originalmente no meu perfil do LinkedIn em 3/1/2024
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